O Ministério Público Federal (MPF) em Minas Gerais obteve sentença que obriga o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a implementar, no prazo de 12 meses, toda a infraestrutura necessária para captação e distribuição de água às famílias do Projeto de Assentamento José dos Anjos, localizado no município de Uberlândia, no Triângulo Mineiro.
Em novembro de 2015, a Justiça Federal já havia concedido liminar no mesmo sentido, mas o Incra e a União, ambos réus na ação, após contestarem a decisão por meio de embargos e agravos de instrumento, continuaram ignorando a ordem judicial.
Naquela ocasião, o juiz federal chamou atenção para o fato de que o próprio Plano Nacional de Reforma Agrária destaca que suas iniciativas devem ir além da mera distribuição de terras, sendo necessário prever ações para que os assentados "possam produzir, gerar renda e ter acesso aos demais direitos fundamentais, como saúde e educação, energia e saneamento".
"Nesse contexto, a disponibilização de água potável para as famílias beneficiárias da reforma agrária, e, ainda, a realização de uma infraestrutura mínima para sua utilização no desempenho da atividade produtiva são providências indispensáveis para a realização desta política pública", afirmou o magistrado.
Na prática, porém, não é o que ocorre. O PA José dos Anjos foi implementado em 2005 e até hoje, 13 anos depois, as 45 famílias que vivem no local não dispõem de rede de captação e distribuição de água.
O Plano de Desenvolvimento Agrário (PDA) previa as condições para implantação de infraestrutura de água, e era tamanha a necessidade, que o cronograma de execução previu prazo de apenas 10 meses. O Incra chegou a fazer o procedimento de licitação para as obras, que foram interrompidas após a perfuração do solo.
O Ministério Público Federal (MPF) tomou ciência da situação em 2014, quando o MP estadual encaminhou representação de queixa dos representantes do PA José dos Anjos contra a omissão do Incra. Solicitado a prestar esclarecimentos, o Incra, embora tenha admitido ser de sua responsabilidade a implantação da infraestrutura, afirmou que não terminava a obra por falta de recursos.
O MPF apontou uma contradição nesse argumento, uma vez que a União e o Incra destinaram milhões de reais, no mesmo período, à desapropriação de imóveis para a criação de novos assentamentos.
Posteriormente, durante o trâmite da ação, o Incra acrescentou novas justificativas, entre as quais a de que, embora reconheça a necessidade de atendimento a essa demanda, ela não se encontraria entre as suas prioridades. Disse ainda que as escolhas no âmbito da política de assentamento estão sujeitas ao juízo discricionário da administração, não podendo o Judiciário, sob pena de ofensa à autonomia dos poderes, imiscuir-se nessas decisões.
Mas para o juízo federal, que adotou na sentença a íntegra dos argumentos já proferidos por ocasião da liminar, "a discricionariedade da Administração não é um poder ilimitado" e o princípio da separação dos poderes deve ser analisado no contexto dos fatos em que é apreciado, "harmonizando-se com os demais princípios constitucionais".
Desse modo, “a implantação da infraestrutura para a captação de água no PA José dos Anjos não pode se sujeitar ao juízo de conveniência e oportunidade da administração para a inclusão na proposta orçamentária de verba específica para o seu custeio”, pois estão em risco direitos fundamentais e irrenunciáveis, como a saúde e a dignidade humanas.
Lembrando ainda que o Incra e a União não conseguiram "comprovar, objetivamente, a sua incapacidade econômico-financeira para arcar com as despesas necessárias para a realização da obra pleiteada na inicial", a sentença destaca que "não há opção estatal no ponto. A omissão é flagrante" e, portanto, o pedido feito pelo MPF deve ser obrigatoriamente atendido.
ACP nº 0005859-44.2015.4.01.3803
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Postado originalmente por: Rádio América – Uberlândia