Esperança nas vacinas mineiras

A corrida contra a COVID-19 tem ao menos 10 vacinas concorrentes em Minas Gerais, desenvolvidas em três universidades: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Ao menos dois candidatos vacinais já estão próximos dos testes em humanos e prometem benefícios que extrapolam o enfrentamento da pandemia, como o domínio de tecnologias úteis no entendimento e no combate a doenças diversas.
A má notícia é que, para vingar, os projetos requerem mais que o talento e fôlego empenhados pelos cientistas do estado até então. Alguns trabalhos podem ser paralisados caso não recebam novos repasses de verba dentro de dois meses. Os pesquisadores também temem que a burocracia atrelada à liberação de recursos e à importação de insumos atrase o desenvolvimento das vacinas nacionais, fundamentais para que o país dê conta das mutações do novo coronavírus. 
Confira os imunizantes em desenvolvimento no estado

Influenza + COVID-19

Tipo: vetor viral
Administração: intranasal
Doses: duas
Fase: pré-clínica
Como funciona: O imunologista Ricardo Gazzinelli, que lidera a equipe de cientistas, explica que os pesquisadores realizaram alterações genéticas no vírus H1N1, causador da gripe, dentro do laboratório. Isso permitiu que ele se tornasse capaz de transportar parte da proteína S do novo coronavírus – aquela que confere ao Sars-Cov-2 a aparência espinhosa e é utilizada por ele para infectar as células humanas. Uma vez inserido no organismo, espera-se que o composto vacinal proporcione imunização à influenza e à COVID-19.
Vantagem: proteção ambivalente.
Estágio de desenvolvimento: De abril a julho, os estudiosos trabalharam na construção do vírus recombinante. Em setembro, realizaram a primeira etapa dos testes em camundongos, que demonstraram resposta imune satisfatória contra o Influenza. Em dezembro, tiveram início aos ensaios com camundongos transgênicos portadores da proteína humana eca2, que torna os roedores vulneráveis à infecção pela COVID-19. Os resultados desta etapa estão previstos para o fim de fevereiro.  
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e Universidade do Estado de São Paulo  (USP).
Financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTIC) e Fundação Oswaldo Cruz.

 

BCG + COVID-19

Instituições envolvidas: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Instituto Butantan.
Financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
Tipo: Recombinante
Administração: intramuscular
Doses: quantidade não definida
Fase: pré-clínica
Como funciona: À frente dos ensaios, o professor Sérgio Costa Oliveira diz que a vacina foi elaborada a partir da inserção de sequências do genoma do novo coronavírus em bacilos de Calmette-Guérin (BCG), os causadores da tuberculose. A modificação genética visa induzir a bactéria a produzir as proteínas S (Spike) e N (nucleocapsídeo viral), que o vírus usa para infectar as células. A expectativa é de que, uma vez inoculado no organismo, o composto estimule a produção de anticorpos contra as duas doenças – a tuberculose e a COVID-19. 
Vantagem: A maior vantagem, segundo Sérgio, é a segurança, já que, na prática, os pesquisadores estão trabalhando com uma vacina que já existe – a BCG -, cujos efeitos colaterais já são conhecidos. Este fator proporcionaria também mais agilidade nas fases clínicas (testes em humanos). 
Estágio de desenvolvimento: Os estudos tiveram início em abril de 2020. A elaboração do composto gênico está em fase final. Os testes em camundongos devem começar em aproximadamente até o fim do primeiro semestre.
Financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

 

Quimera proteica

Tipo: vacina de subunidade
Administração: intramuscular
Doses: duas
Fase: pré-clínica
Como funciona: Segundo o professor Flávio da Fonseca, virologista do CT Vacinas da UFMG, o projeto se baseia na modificação genética da bactéria E.coli. Ela recebeu pedaços do genoma do novo coronavírus para que se tornasse capaz de produzir duas proteínas do vírus de forma combinada. No caso, as proteínas S (Spike) e N (do nucleocapsídeo viral). Ambas são usadas pelo Sars-Cov-2 para infectar as células humanas. Uma vez produzida pela bactéria E.coli, essa combinação, chamada de quimera, é purificada e transformada em composto vacinal. Dentro do corpo humano, a ideia é que a estrutura estimule a produção de anticorpos contra a COVID-19.
Vantagem: O baixo custo de produção. A parasitologista Ana Paula Fernandes destaca que a fabricação é, inclusive, compatível com a estrutura disponível na Fundação Ezequiel Dias (Funed). O governo do estado e a UFMG já teriam iniciado os trâmites da parceria. 
Estágio de desenvolvimento: Os trabalhos foram iniciados em agosto. A pesquisa está na fase final de testes com camundongos. A expectativa é de que o resultado final dessa fase saia entre março e abril.
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) 
Financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTIC).

Partículas do vírus

Tipo: Virus like particles (VLP)
Administração: intramuscular
Doses: duas
Fase: pré-clínica 
Como funciona: Segundo o professor Sergio Oliveira de Paula, que conduz os estudos, a vacina é do tipo VLP (Virus-like particle, em inglês), também chamada de partícula pseudoviral. Trata-se do Sars-CoV-2 sem o seu material genético. O material não é capaz de infectar o corpo humano. Porém, quando inoculado no indivíduo, induz à resposta imune. 
Vantagem: Ao contrário das vacinas feitas a partir do vírus vivo ou atenuado, essa modalidade não provoca infecção. Assim, é mais segura para grupos com imunidade frágil.
Estágio de desenvolvimento: O projeto teve início em  setembro de 2020. A equipe do professor Sérgio de Paula já finalizou a construção do veículo vacinal. No momento, os pesquisadores se dedicam à produção do imunizante em larga escala para os testes em camundongos, que devem começar dentro de dois meses na Fiocruz.
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
Financiamento: Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq).

 

Gotas com bactérias probióticas

Tipo: vetor recombinante
Administração: oral 
Doses: quantidade não definida
Fase: pré-clínica (testes in vitro)
Mecanismo de ação: Coordenador do projeto, o professor Cláudio Galuppo Diniz explica que a vacina tem como vetor uma bactéria probiótica, benéfica aos seres humanos. Os cientistas a modificaram por meio de métodos de engenharia genética. Ou seja: inseriram nessa estrutura ao menos seis fragmentos retirados da superfície do novo coronavírus, onde se concentram duas proteínas. Uma é a proteína S ou Spike, que confere ao Sars-Cov-2 a aparência espinhosa. A outra é a N, encontrada no nucleocapsídeo viral. Ambas são utilizadas pelo vírus para infectar os seres humanos. Uma vez ingerida, a bactéria modificada penetra diretamente na mucosa oral e apresenta as proteínas que carrega às células do corpo que, então, reagem produzindo anticorpos contra a COVID-19. 
Vantagem: Permite administração mais amigável em crianças e pessoas com debilidades, já que dispensa sendo oral, seringas e agulhas. 
Estágio de desenvolvimento: Os trabalhos foram iniciados em agosto de 2020. A equipe de pesquisadores, no momento, finaliza a construção da bactéria geneticamente modificada.  Os cientistas esperam dar início aos testes em camundongos até o fim do segundo semestre de 2021. 
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)
Financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig).

 

Levedura de cerveja

Tipo: vacina de subunidade
Administração: intramuscular
Doses: duas
Fase: pré-clínica
Como funciona: De acordo com o professor Sérgio Oliveira de Paula, o princípio é semelhante ao da produção da Hepatite B. Os pesquisadores inseriram genes do novo coronavírus em uma levedura – a mesma utilizada na produção de cervejas. A ideia é que, uma vez geneticamente modificado, o fungo se torne uma espécie de fábrica da proteína S (Spike), aquela que o vírus utiliza para infectar as células humanas. A proteína é posteriormente isolada, purificada e injetada no corpo humano, onde espera-se que induza à produção de anticorpos contra o Sars-Cov-2.
Vantagem: Segurança, uma vez que utiliza o vírus sem material genético, o que impede que ele se reproduza dentro do vacinado. A ausência de vetores (bactérias ou outros vírus) também reduz as chances de reações adversas.
Estágio de desenvolvimento: As atividades tiveram início em setembro. Os cientistas concluíram a construção da levedura modificada e aguardam que ela comece a secretar a proteína S. O próximo passo será a testagem em camundongos, que deve ocorrer dentro de seis meses. 
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
Financiamento: Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq).

 

Febre amarela + COVID-19

Tipo: vírus atenuada (quimera viral)
Administração: intramuscular
Doses: duas
Fase: pré-clínica
Como funciona: Conforme o professor Sérgio Oliveira de Paula, da UFV, a vacina pressupõe a inserção de genes do novo coronavírus na vacina contra a febre amarela, que é feita a partir de um vírus atenuado da doença. Com isso, espera-se que o imunizante seja capaz de gerar dupla proteção – contra a febre amarela e a COVID-19. 
Vantagem: Além da dupla proteção, Sérgio destaca a segurança, a potencial eficácia e a facilidade de produção. Em primeiro lugar, porque a vacina contra a febre amarela está no mercado há mais de 50 anos e seus efeitos adversos já são conhecidos. Trata-se ainda de produto potente já que, com apenas uma dose, é capaz de proteger o vacinado por toda a vida. O composto seria, por fim, viável de se produzir em larga escala no Brasil, pois é fabricado em ovos embrionados, técnica que os institutos de pesquisa brasileiros utilizam há décadas.
Estágio de desenvolvimento: A pesquisa teve início em setembro. Os cientistas, no momento, trabalham na construção do composto genético. Ainda não há previsão de início das próximas etapas.
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
Financiamento: Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), por meio de edital do Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI).

RNA mensageiro

Tipo: Vacina de RNA
Administração: intramuscular
Doses: duas doses
Fase: pré-clínica
Como funciona: A professora Santuza Teixeira, professora titular do Departamento de Bioquímica e Imunologia da UFMG, esclarece que a candidata a vacina é baseada em mRNA ou RNA mensageiro sintético. Ele é encapsulado por uma vesícula transportadora de proteínas, o lipossomo. Uma vez inoculada no corpo humano, essa estrutura entra nas células sem dificuldade, pois é reconhecida como parte delas. Dentro da célula, o composto mimetiza a proteína S (Spike), presente no vírus Sars-CoV-2. Essa cópia não provoca adoecimento, mas é suficiente para despertar o sistema imune, que reage criando defesas contra o novo coronavírus.
Vantagem: Agilidade na adaptação, em caso de mutação do vírus. Conforme Santuza, alterar o RNA para produzir novas versões da vacina contra COVID-19 e até mesmo outros imunizantes é um processo relativamente simples.
Estágio de desenvolvimento: Os estudos foram iniciados em janeiro de 2021. Os cientistas trabalham na construção do composto. 
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) 
Financiamento: Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), por meio de edital do Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI). 

 

MVA + Sars-CoV-2

Tipo: vetor viral
Administração: intramuscular
Doses: duas
Fase: pré-clínica
Como funciona: O professor Flávio da Fonseca conta que, neste método, o protagonista é o vírus MVA, ou Vaccinia Ankara, usado como vetor da vacina contra varíola. Submetido a técnicas de engenharia genética, ele recebeu genes do novo coronavírus e, assim, passou a produzir as proteínas S (Spike) e N (do nucleocapsídeo viral) – desta vez, separadamente. A expectativa é de que o MVA, em contato com as células humanas, induza à resposta imune contra a COVID-19. 
Vantagem: O MVA é um vírus com genoma grande e, portanto, consegue acomodar mais de um gen, permitindo a produção de múltiplas proteínas simultaneamente.
Estágio de desenvolvimento: Com desenvolvimento iniciado em dezembro de 2020, o composto já está pronto. Os pesquisadores aguardam a liberação para os testes em camundongos.
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) 
Financiamento: Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), por meio de edital do Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI).

 

Ad5 + Sars-CoV-2

Tipo: vetor viral
Administração: intramuscular
Doses: duas
Fase: pré-clínica
Como funciona: De acordo com o professor Flávio da Fonseca, o imunizante consiste na versão geneticamente modificada do Adenovírus 5, o Ad5, causador de infecções respiratórias. Depois de atenuá-lo, tornando-o incapaz de provocar doenças, os cientistas inseriram partes do genoma do novo coronavírus no Ad5, criando um protótipo que produz proteínas S, N, entre outras presentes no Sars-Cov-2. Dentro do organismo, o composto induz à resposta imune contra a COVID-19. 
Vantagem: Segundo o professor Flávio Fonseca, de todos os vetores virais, os adenovírus costumam induzir as respostas imunes mais intensas. 
Estágio de desenvolvimento: A pesquisa começou em abril de 2020. Atualmente, encontra-se em fase final de testagem em camundongos.
Instituições envolvidas: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) 
Financiamento: Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), por meio de edital do Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI).

Postado originalmente por: VinTV

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