Maior grupo de mídia do país começa a testar tecnologia que une o sinal da antena de TV e a conexão de internet para ofertar conteúdo e publicidade mais segmentados e interativos
Maior conglomerado de mídia do Brasil, o Grupo Globo se prepara para acelerar investimentos em novas avenidas de crescimento.
Entre suas principais apostas estão o projeto da TV 3.0, com o novo padrão brasileiro de televisão digital, e a entrada no crescente mercado de apostas esportivas e online, por meio de uma parceria com a MGM Resorts International para operar a marca BetMGM.
Com essas frentes de negócios, o grupo prevê novas fontes de receitas para monetizar sua base de usuários, que tem alcance nacional, uma vez que a TV Globo atinge 94% dos lares brasileiros, segundo dados recentes da Kantar Ibope Media.
No mercado de bets, que tem atraído grandes competidores internacionais, como a inglesa Bet 365, a grega Betano, a sueca Betsson e a americana Caesars Sportsbook, o Grupo Globo deve dividir com a MGM o aporte inicial de R$ 30 milhões para regularizar uma casa de apostas no país. O valor é referente à licença que deve ser paga ao governo federal para a exploração comercial até o fim do ano.
Na outra frente, a nova geração de TV digital, que ainda depende de regulamentação da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), promete abrir novas possibilidades de geração de receitas para as emissoras, como a publicidade interativa.
O grupo planeja explorar o potencial de segmentação da TV 3.0 para o mercado publicitário, com a oferta de produtos para uma região formada por alguns bairros de uma cidade, por exemplo. A liderança no mercado de mídia é apontada como um trunfo para avançar com o modelo a partir de 2025.
A nova tecnologia permite também que o telespectador responda a um quiz patrocinado na tela com poucos cliques, além de comprar mercadorias relacionadas à atração (veja mais abaixo), por meio de uma barra lateral mostrada em TVs com novo padrão, com modelos já produzidos desde 2022.
O Grupo Globo pretende utilizar recursos próprios para investir no projeto, segundo o diretor de tecnologia do maior conglomerado de mídia do país, Raymundo Barros. O executivo não forneceu uma projeção do valor necessário, em um momento de cenário desafiador para um setor ainda alavancado financeiramente e pressionado pela competição com plataformas de streaming.
O setor brasileiro de radiodifusão defende a abertura de linhas de financiamentos por bancos de fomento, como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), para viabilizar o lançamento da TV 3.0 no ano que vem, segundo Barros.
“Com um marco regulatório, a Globo vai fazer os investimentos especialmente para os mercados mais relevantes. Em 2025, pretendemos ter uma estação piloto da TV 3.0 no Rio ou em São Paulo”, afirmou o executivo durante apresentação dos protótipos da nova tecnologia.
O Grupo Globo já começou a testar a nova tecnologia com marcas de televisores, como as sul-coreanas Samsung e LG e a chinesa Hinsense, além da americana Intel. Fabricantes de receptores, conversores e soluções digitais com presença na China, como a Jiuzhou, a Tolka e a Amlogic, também participam.
No início do agosto, a CEO do SBT, Daniela Abravanel Beyruti, disse à Bloomberg Línea que a implantação da nova geração da TV vai exigir um “investimento muito alto” e que as emissoras do país possuem condições distintas para esse projeto.
O canal fundado por Silvio Santos lançou no último dia 19 sua plataforma de streaming, sem cobrança de assinatura, com um modelo remunerado com a venda de cotas publicitárias.
A exemplo do Grupo Globo, o SBT também pretende entrar no mercado de apostas esportivas e jogos online por meio da TQJ (Todos Querem Jogar), empresa da qual faz parte o Grupo Silvio Santos. O pedido de licença de operação foi protocolado neste mês, segundo o CIO do grupo, Leonardo Sampaio.
Navegação por aplicativos
O Ministério das Comunicações anunciou em abril que o novo padrão da televisão aberta deve estar pronto para transmissão no próximo ano, com o objetivo de “revolucionar o setor” com uma integração completa dos canais de TV com a internet. A decisão final sobre os padrões do serviço de radiodifusão é da Presidência da República.
Antes da definição do padrão de transmissão da TV 3.0, houve discussões entre os players do setor com atuação no Brasil no âmbito do Fórum do SBTVD (Sistema Brasileiro de Televisão Digital), presidido pelo diretor da Globo. Em julho, o conselho deliberativo do grupo conclui a fase de debates sobre a tecnologia que deveria ser adotada.
O Fórum SBTVD (Sistema Brasileiro de Televisão Digital), que tem hoje o diretor da Globo na presidência, encaminhou ao ministério a recomendação para a adoção da tecnologia de transmissão do sistema ATSC 3.0, desenvolvida nos Estados Unidos, como parte do conjunto de tecnologias da TV 3.0.
A navegação pelos canais de TV passaria a ser feita apenas por meio de aplicativos, o que significaria abandonar o sistema vigente há décadas de identificação das emissoras pelo número do canal.
E-commerce e streaming integrados
Além da transmissão ao vivo por sinal aberto, o novo padrão da TV 3.0 deve permitir que os canais ofereçam conteúdos adicionais sob demanda, que aparecem na lateral da tela, como quiz, chat, notícias, vídeos e anúncios.
A Globo exibiu protótipos com uso dos recursos em novelas, reality shows e telejornais, com testes realizados na antiga sede da Globosat na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio de Janeiro.
A qualidade da imagem deve pelo menos quadruplicar, segundo nota do Ministério da Comunicações. O padrão atual, que é o da TV Digital com Full HD, passaria a ser transmitido pelo ar em até 4k, ou até 8k caso seja visto pela internet. Isso significa que a imagem teria ao menos quatro vezes mais pixels, com mais informações por espaço, maior resolução em cores e maior nitidez.
O contraste também seria aprimorado, por meio de tecnologias de HDR (High Dynamic Range). Com som imersivo, o telespectador poderia, por exemplo, escolher entre ouvir apenas o microfone do cantor com a banda ou destacar o som da plateia.
O novo padrão deve permitir ainda integrar o comércio eletrônico e as plataformas de apostas com as imagens exibidas, com transações de compra concluídas diretamente na tela da TV.
A Globo também mostrou a possibilidade de usar a rede de dados da TV 3.0 integrada ao segmento de mídia exterior, o chamado out of home. A companhia é dona de 27% da Eletromídia (ELMD3), maior empresa brasileira desse setor, que conta com mais de 66.000 painéis espalhados pelas principais cidades do país.
O Globoplay, a plataforma de streaming do grupo, continuaria com seu aplicativo próprio e um modelo de negócios com base em cobrança de assinaturas, segundo Barros. O executivo disse que o serviço hoje tem capacidade para suportar até 15 milhões de acessos simultâneos.
*Informações: Sérgio Ripardo/Bloomberg Línea