As atuais metas são 3,25% em 2023 e 3% em 2024 e 2025, com margens de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos
A equipe econômica avalia a possibilidade de elevar as metas de inflação já estabelecidas em meio à pressão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o Banco Central por juros mais baixos, mas apresenta ressalvas sobre as eventuais alterações. Uma das ponderações é que a revisão deste ano não traria efeito prático sobre a política monetária no curto prazo.
As atuais metas são 3,25% em 2023 e 3% em 2024 e 2025, com margens de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos. O alvo é considerado “inexequível” pela presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann. Lula, por sua vez, vê como ideal o patamar de 4,5%, o mesmo fixado em seus dois primeiros mandatos.
Uma revisão para cima do objetivo a ser perseguido pelo BC em 2024 abriria espaço para que o início do corte de juros fosse antecipado – hoje a taxa básica (Selic) está em 13,75% ao ano. No governo, há um temor de que as taxas elevadas comprometam o crescimento da economia.
A equipe econômica do governo pondera, entretanto, que qualquer mudança na política monetária leva até 18 meses para surtir efeito pleno na economia. Ou seja, uma leve alteração na meta não provocaria uma redução dos juros no curto prazo e o impacto sobre a inflação só seria sentido em 2024.
O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, disse na sexta-feira (10), em evento promovido pela Bradesco Asset Management, que a pasta não pautou discussão sobre uma mudança nas metas para a inflação em seus órgãos técnicos, mas sugeriu que o debate é válido em meio à inflação global elevada.
A meta de inflação é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), formado pelos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) e pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto. Formalmente, a definição do objetivo depende dos três votos.
No cronograma habitual do CMN, o tema é discutido nas reuniões de junho, com três anos de antecedência. Em 2023, por exemplo, a previsão é definir a meta de inflação a ser buscada em 2026 e ratificar a de anos anteriores. Tecnicamente, para alterar as metas já fixadas, será necessário o governo editar um decreto autorizando essa mudança.
Mas o assunto pode ser colocado em discussão antes de junho, caso seja pautado por um dos integrantes do colegiado. A primeira reunião do CMN sob o governo Lula está prevista para a próxima quinta-feira (16). De acordo com membros da equipe econômica, a pauta já está definida, sem a discussão das metas de inflação. Nada impede, porém, que o tema venha a ser incluído —inclusive de forma extraordinária pelo presidente do colegiado (no caso, Haddad).
Caso o governo leve o tema ao CMN, Campos Neto já sinalizou que irá discutir tecnicamente a eventual revisão das metas futuras de inflação.
Na ata do Comitê de Política Econômica (Copom), divulgada na última terça (7), o BC ressaltou que “conduz a política monetária com base nas metas estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional”. “Em resumo, mais importante do que a análise das motivações para a elevação das expectativas, o Comitê enfatiza que irá atuar para garantir que a inflação convirja para as metas”.
O presidente do BC disse em ocasiões anteriores que uma eventual mudança não é uma decisão que cabe somente à autoridade monetária, ressaltando que uma medida nesse sentido não traria ganhos para a atuação no combate à inflação.
“O BC tem um voto dentro de três do CMN. Isso pode ser debatido no CNM, mas a opinião do BC hoje é que teria pouco a ganhar em termos de credibilidade”, afirmou o presidente da autoridade monetária em março de 2022.
Na visão de analistas, a elevação do alvo poderia transmitir a mensagem de um governo mais leniente com a alta de preços, gerando dúvidas se a eventual revisão teria os efeitos desejados pelo governo. As críticas do presidente à condução do BC têm elevado as projeções de inflação e pressionado os juros.
A inflação projetada pelo mercado financeiro para 2023 no boletim Focus da última segunda (6) é de 5,78%, mais de um ponto percentual acima do teto do objetivo a ser perseguido pelo BC (4,75%). Já os cálculos do BC apontam para uma inflação de 5,6% em 2023. Isso representaria um estouro da meta pelo terceiro ano consecutivo.
A inflação ficou acima do teto do alvo tanto em 2021 quanto em 2022. Em carta aberta endereçada ao ministro da Fazenda, Campos Neto elencou cinco fatores para o estouro da meta no ano passado, como inflação herdada do ano anterior, alta das commodities e retomada na demanda de serviços e no emprego após a reabertura da economia.
Para 2024, período de maior relevância para a atuação do BC hoje, a expectativa do mercado para oÍndice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu para 3,93% – já acima do alvo central (3%). Já o BC elevou a previsão para 3,4%.
Em um cenário alternativo, no qual a Selic é mantida constante no atual patamar por mais tempo, as projeções de inflação do Copom são de 5,5% para 2023 e 2,8% para 2024.
Mudança de meta
Quem define a meta de inflação?
O Conselho Monetário Nacional (CMN), integrado pelo ministro da Fazenda (Fernando Haddad), pela ministra do Planejamento (Simone Tebet) e pelo presidente do Banco Central (Roberto Campos Neto). Cada conselheiro tem direito a um voto e as decisões são tomadas por maioria simples.
Quando normalmente é definida a meta de inflação?
Um decreto de 1999 estabelece que as metas de inflação precisam ser definidas até 30 de junho de três anos antes. Ou seja, em junho de 2023 seria definida a meta de 2026. Para mudar os objetivos anteriores a 2026, seria preciso a Presidência da República publicar um outro decreto para criar essa possibilidade.
Quem levaria a pauta da mudança de meta ao CMN?
Pelo regimento do CMN, publicado em forma de decreto de 1994, o presidente do órgão – o ministro da Fazenda (no caso, Haddad) – define a pauta dos assuntos a serem discutidos em cada reunião. Ele também pode aprovar a inclusão de assuntos extrapauta quando têm caráter de urgência, relevante interesse ou de natureza sigilosa.
Os demais membros podem contestar a pauta?
Eles podem solicitar vistas de assunto constante da pauta ou apresentado extrapauta, abster-se na votação de qualquer assunto e solicitar o adiamento da votação de assuntos.
A mudança de meta em prazo inferior já foi feita antes?
Sim, em ao menos duas ocasiões. Em 2002 e 2003. (Catia Seabra e Nathalia Garcia/Folhapress).
As informações são do Diário do Comércio.
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil.