Presos liberados na pandemia cometeram 183 crimes em Juiz de Fora

Cerca de 33,65% dos 12.385 presos liberados em Minas Gerais durante a pandemia de Covid-19 voltaram a cometer crimes em 2020. Somente em Juiz de Fora, foram 183 crimes cujos autores foram pessoas nestas condições, sendo que a maioria dos registros é de furto. A cidade é a quinta do estado em que os presos liberados mais se envolveram em outras ocorrências.

Os dados são do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que divulgou dados sobre crimes praticados por presos liberados pelo sistema carcerário entre 16 de março e 31 de dezembro do ano passado, em razão da Portaria Conjunta nº19/2020, que recomenda a todos os juízos criminais e de execuções penais de Minas Gerais a aplicação de medida de prisão domiciliar aos presos em regime aberto e semiaberto. A norma, firmada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e pelo Poder Executivo estadual, também determina que seja avaliada a aplicação de uma medida alternativa à prisão a todos os detentos que se enquadrarem no grupo de risco da Covid-19 definido pelo Ministério da Saúde, e foi criada como forma de minimizar o contágio pelo coronavírus nas unidades prisionais do estado.

O balanço, feito por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Criminais (Caocrim), com o auxílio do Departamento Penitenciário do Estado (Depen), que integra a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), aponta 11.082 ocorrências policiais envolvendo os presos liberados em todo o estado, sendo 4.167 responsáveis pela totalidade dos registros. Deste total, 55,54% se envolveram em mais de uma ocorrência. Ainda conforme o levantamento, os novos crimes ocorreram em 450 municípios distintos, o que indica que 52,94% dos municípios mineiros tiveram crimes realizados nestas condições.

Em Juiz de Fora, o quinto município com mais casos, foram registradas 30 ocorrências de furto, 25 de ameaça, 24 de tráfico de drogas e outras 23 de foragidos da Justiça. Os liberados também se envolveram em 14 casos de uso e consumo de drogas, 12 de roubo, dez de agressão e sete homicídios

O levantamento aponta que o município mais afetado foi Belo Horizonte, com 1.326 registros policiais. Em seguida, aparece Contagem, com 265 ocorrências. O terceiro município com mais casos é Sete Lagoas, onde foram registrados 243 crimes envolvendo os liberados, seguido por Uberlândia, com 204 situações.

Delitos diversos

Ocorreram 687 registros em contexto de violência doméstica, sendo 236 ameaças, 162 agressões, 148 lesões corporais, 39 descumprimentos de medida protetiva de urgência, três estupros de vulneráveis, dois homicídios e um estupro, entre outros.
Os dados apontam ainda cumprimentos de mandado de prisão, atritos verbais, portes ilegais de arma de fogo e estelionato. Segundo o MP, os presos liberados se envolveram também em ocorrências de dano, receptação, perturbação do trabalho ou sossego, ingresso ilegal de celular/rádio em estabelecimento prisional, falsa identidade, estelionato, desacato, desobediência e apropriação indébita.

Mais de 800 desligamentos em JF e região

Conforme reportagem publicada pela Tribuna em março do ano passado, quando começaram as liberações, a expectativa era de que entre 200 e 300 detentos de Juiz de Fora fossem transferidos para o regime de prisão domiciliar a partir do dia 19 daquele mês, como medida de prevenção aos riscos de contaminação pelo coronavírus. Desta forma, a previsão era de que a portaria atingisse cerca de 10% dos detentos, já que a cidade possuía em torno de 2.700 presos.

Segundo o TJMG, que repassou apenas dados relativos à 4ª Região Integrada de Segurança Pública, que integra Juiz de Fora e outros 85 municípios, foram 819 desligamentos de unidades prisionais por conta da pandemia entre 17 de março de 2020 e 18 de janeiro deste ano. O órgão também registrou 75 reentradas de detentos que tinham sido desligados e, posteriormente, retornaram a unidades prisionais. A recomendação de prisão domiciliar e de medida alternativa à prisão continua vigente, e deve perdurar enquanto for mantido o status de pandemia.

Por meio de nota, a 4ª Região de Polícia Militar comentou que “tem como missão constitucional o policiamento ostensivo e de preservação da ordem pública, que está sendo executada diuturnamente nos 86 municípios mineiros de sua responsabilidade territorial incluindo a cidade de Juiz de Fora, com vistas à diminuição do crime e ao consequente aumento da sensação de segurança da população ordeira. O trabalho preventivo da PMMG (4ª RPM) prevê inclusive a execução de visitas de acompanhamento junto aos presos liberados durante o período de pandemia da Covid-19, o que está sendo devidamente realizado”, diz o texto.

Análise

Para o especialista em segurança pública e professor da PUC-Minas, Luis Flávio Sapori, a medida de liberação do presos, no geral, foi acertada. Porém, ele pontua que a falta de critério para a liberação foi um ponto negativo. “A medida tomada pelo Tribunal de Justiça me pareceu acertada, pois conseguiu impedir o agravamento da pandemia no sistema prisional do estado, que sofre com superlotação e com muitas prisões em péssimas condições de higiene. Por outro lado, temos que considerar que aconteceram erros em termos de critérios e rigor para liberação dos presos. Muitos com crimes graves foram liberados, acabaram voltando à criminalidade e vitimizando outras pessoas. Porém, em termos gerais, foi mais benéfica que maléfica para a sociedade mineira, pois a criminalidade violenta não cresceu, ao contrário, diminuiu em Minas ao longo de 2020, confirmando que a medida do TJMG não impactou este fenômeno”, pontuou.

Sobre a medida, o MPMG informou que, entre os presos que não foram liberados, 4.335 testaram positivo para Covid-19 no período. Destes, nove morreram em razão da doença. Ou seja, o percentual de mortes de pessoas reclusas no sistema penitenciário estadual em razão da doença é de 0,20%.

O MPMG destacou ainda que as estatísticas detalhadas foram disponibilizadas pelo Gaeco e Caocrim a todos os promotores de Justiça do estado que atuam na área criminal e de execução penal, que poderão avaliar e requerer a revogação do benefício da prisão domiciliar, bem como a instauração de procedimento para apuração de falta grave.

TJMG contesta dados

Depois que o Ministério Público divulgou os dados, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e o Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF) se manifestaram. Conforme nota, os órgãos “esclarecem que os dados estatísticos não conferem com os dados oficiais divulgados pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp).

A nota aponta que, conforme o Relatório de Diagnóstico Situacional, referente ao período de 17 de março de 2020 a 18 de janeiro de 2021, os números oficiais são os seguintes: 12.341 pessoas que estavam privadas de liberdade, em regime semiaberto, foram beneficiadas com a prisão domiciliar como medida de prevenção à propagação/transmissão da Covid-19 no ambiente prisional. Dentre elas, 1.463 retornaram ao cárcere por prática de novo crime.

“Dessa forma, percebe-se que, na verdade, 11,8% dos beneficiados retornaram ao cárcere por reiteração delituosa, e não os 33%, como equivocadamente informado. Ressalta-se que as medidas adotadas evitaram a contaminação em massa no sistema penitenciário e a consequente sobrecarga das unidades de saúde de nosso estado. Por fim, deve ser enfatizado que o Estado de Minas Gerais, apesar de ter a segunda maior população carcerária do Brasil, apresenta o menor número de morte em prisões causadas pela Covid-19”, disse o texto.

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Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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