Nathércia Abrão fala sobre resistência feminina em cargos de gestão

“Eu ainda percebo discriminações por ser mulher. Depois que eu me apresento, digo que sou uma profissional da saúde e que tenho o mesmo cargo que eles, aí as coisas mudam” (Foto: Fernando Priamo)

Cuidar, muito mais que um verbo, é a lente pela qual Nathércia olha para o mundo. A missão que ela assume é norteada pelo olhar para o outro e tem como diretriz a organização e a rotina. Ela conta que, desse lugar, sempre se entendeu como mulher. E que, apesar de saber como há questões profissionais duras relacionadas à mulher, nunca tinha parado para pensar que uma profissional teria que enfrentar diferenças para ser bem-sucedida no mercado de trabalho.

“Sempre achei isso tudo muito natural. O que importa na pessoa é a competência. É você fazer aquilo que você ama, fazer as coisas acontecerem e estar trabalhando em algo que dá prazer. A partir daí, sempre fui trabalhando muito. Gosto muito do que eu faço. Escolhi medicina como profissão e sou muito feliz.” Formada pela UFJF, Nathércia se especializou em pediatria e nefrologia pediátrica no Rio de Janeiro e voltou para cuidar das crianças de Juiz de Fora.

“Dentro da medicina, eu optei, agora neste momento, pela gestão em saúde. Trabalho que eu admiro, gosto muito, faço com o maior prazer. Na medicina tem um fator: as mulheres não têm diferenças salariais com os homens. Eu, enquanto médica, recebo o mesmo valor, o mesmo honorário, pelo meu trabalho que um médico do sexo masculino recebe. A gente não percebe essa diferença dentro da medicina.”

LEIA MAIS:

Embora a realidade na área seja diferente de muitas outras, ela demonstra indignação ao ver que outras mulheres possam não obter reconhecimento pelo trabalho que desempenham. “Eu sei que o mercado é cruel, que as mulheres têm salários em torno de 30% a 40% mais baixos que o salário dos homens para o mesmo cargo, considero isso abominável, inadmissível e inaceitável. A mulher tem que lutar pelos seus direitos, não pode aceitar esse tipo de discriminação. O trabalho é o mesmo. Os resultados são os mesmos ou melhores.”

Necessidade de posicionamento

Encarar a gestão em saúde, segundo Nathércia, é estar em um meio em que ainda há uma prevalência de homens ocupando cargos. Por isso, ela afirma que sente que os olhares que recaem sobre ela, por ser mulher, são diferentes.

“Teve (diferença) e ainda tem até hoje, nesse exato momento, eu ainda percebo discriminações por ser mulher. Depois que eu me apresento, digo que sou uma profissional da saúde e que tenho o mesmo cargo que eles, aí as coisas mudam, e as pessoas passam a me tratar como uma profissional igual a eles.”

A postura da médica, no entanto é de reconhecer a importância e a responsabilidade de estar no local que ocupa. “Vivo falando isso. No sistema Unimed, ainda há poucas mulheres em cargos de diretoria. Nos congressos e eventos dessa área, vejo que a mulher ainda é minoria. Precisamos nos posicionar nesses espaços. Competência todos nós temos, não interessa sexo, raça, religião.” Para ela, todos os olhares enviesados que são endereçados às mulheres ainda estão relacionados a uma cultura que precisa ser modificada. Para isso, Nathércia aponta que o acesso à educação é o melhor caminho. “Hoje estou à frente de uma empresa, onde 65% das colaboradoras são do sexo feminino. Destas, 62% estão em cargos de gerência, isso é muito interessante! Depende muito de um posicionamento nosso, de determinação, de acreditarmos de que podemos sempre fazer melhor. A mulher tem se alertado para isso. A gente tem muita alegria de ter esse DNA: a questão do feminino contida na marca Unimed, eu fico muito feliz.”

Ela ressalta que ter mulheres na gestão faz toda a diferença. “As mulheres são mais organizadas, determinadas, levam o trabalho muito mais a sério na empresa, de forma geral. Ter mulher na equipe é sinal de que as coisas vão fluir de maneira adequada. Não estou querendo dizer, com isso, que com o homem não vá. Vai também. Mas é uma questão de postura, de educação, de fazer com profissionalismo a sua atividade. Temos que ter profissionalismo em qualquer que seja a nossa escolha, com isso, vamos chegar onde quisermos.”

As mulheres, segundo a médica, fizeram a situação evoluir a partir das oportunidades que aproveitaram. Mas a situação só muda, quando as mulheres se aproximam dos seus objetivos. “Vejo mulheres assumirem profissões que eram impensáveis, porque elas são mulheres. Hoje se tornaram vários casos de sucesso. Isso é uma motivação para que outras entendam do que são capazes.” No que diz respeito ao trabalho, ela pensa que o diferencial é investir e acreditar na profissão escolhida. “Fazendo isso, vão ter sucesso, não tem dúvida. Exercer o ofício com amor, bem feito, não tem como dar errado.”

Mulheres no futuro

Nathércia Abrão acredita que, cada vez mais, as mulheres vão ocupar lugares de destaque na gestão das empresas. Algo que não deve estar restrito ao ramo da saúde, mas em todas as áreas de trabalho. “Nós temos, aqui no Brasil e no mundo, vários casos de sucesso de mulheres que enfrentaram a vida, o trabalho, e hoje elas são exemplo, de uma ótima profissional.”

Ela reitera que as mulheres devem ser sempre bem-vindas, porque carregam uma grande capacidade de construir no seu sentido mais amplo. “Ouvi um ditado outro dia que eu achei muito interessante. A mulher é mais forte porque ‘metade do mundo é mulher e a outra metade são filhos das mulheres’. Isso é verdade, se pararmos para pensar temos o poder. Basta a gente querer, porque querer é poder. Se a gente quer, a gente vai chegar onde a gente precisa chegar. A gente tem que acreditar que as coisas acontecem e que dependem única e exclusivamente de nós”.

Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

Pesquisar