Infectologista orienta sobre medidas para diminuir exposição ao coronavírus

Apesar de decreto municipal recomendar que juiz-foranos só saiam de casa em casos de necessidade, movimento nas principais avenidas da cidade é crescente (Foto: Fernando Priamo)

Ao longo das últimas semanas, notou-se um aumento significativo do número de pessoas circulando pelas ruas da cidade. Segundo dados da Prefeitura de Juiz de Fora, o isolamento social caiu de 56% na semana de 13 de abril para 51% em 4 de maio, mantendo-se neste patamar até esta sexta-feira (12). De acordo com dados do painel gerencial, nos últimos sete dias, entre 5 e 12 de junho, a média de isolamento social no município teve taxa de 51,69%. No entanto, detalhamento obtido pela Tribuna a partir de monitoramento feito pela empresa Inloco, que mensura o deslocamento por meio do GPS de celulares, mostra que o percentual de pessoas que permaneceram isoladas em suas residências pode ser menor, e corresponderia a uma média de 40,45% entre 5 e 11 de junho. Os dados apontam que o número de juiz-foranos circulando nas ruas estaria aumentando. Além das pessoas que não podem ficar em casa porque continuam trabalhando em regime presencial, há ainda, como constatado pela Tribuna, aquelas que saem simplesmente por não conseguirem ficar o tempo todo dentro de casa. Concomitantemente, o número de casos de coronavírus na cidade continua aumentando.

A partir desses dados, a Tribuna foi às ruas entre 27 de maio e 2 de junho para registrar a movimentação na cidade e consultou o infectologista e chefe do setor de Gestão da Qualidade e Vigilância em Saúde do Hospital Universitário da UFJF, Rodrigo Daniel de Souza, a respeito de quais medidas e comportamentos podem ser adotados para que a população diminua seu grau de exposição ao coronavírus. Para o especialista, as pessoas terão de aprender com o que ele chama de “novo normal”. “Não dá mais para as pessoas saírem por qualquer motivo. As pessoas que têm condições vão ter que a aprender a mexer em aplicativos, evitar ir em banco e agência lotérica para pagar uma conta”, exemplifica. Para aqueles que precisam sair, ele recomenda que saiam de preferência sozinhos e tentem circular o mínimo possível. “Agora é preciso ser vigilante consigo e com o outro e tomar todos os cuidados necessários durante todo o tempo”, diz.

Máscaras devem cobrir nariz e boca

Apesar de a maioria da população estar cumprindo o decreto municipal que obriga o uso de máscaras em ambientes públicos, muitas pessoas ainda a utilizam de forma inadequada. Nas ruas, é possível observar aqueles que a colocam somente no queixo, ou, ainda, somente sobre a boca, deixando o nariz exposto a possível contaminação. “Algumas pessoas banalizam o uso das máscaras, outras a utilizam de forma incorreta por não saberem direito como usar. Mas a máscara deve cobrir toda a região inferior do rosto, principalmente boca e nariz”, orienta o infectologista.

O médico explica que a Covid-19 é uma doença eminentemente de transmissão respiratória, e facilmente transmitida de uma pessoa para outra. Portanto, é fundamental usar máscara, principalmente quando há contato mais próximo com outra pessoa. “A máscara é usada não só para proteger a nós, mas também para proteger o outro. Então, quando há o contato mais próximo, é fundamental o seu uso. Algumas pessoas puxam a máscara para frente quando vão falar com alguém. Isso está errado. É nesses momentos que devemos estar mais protegidos”.

Sem válvulas

Ele orienta as pessoas a não usarem máscaras com válvulas na parte da frente. Segundo o infectologista, esse tipo de equipamento possibilita que o ar saia da máscara. Caso a pessoa esteja infectada com o coronavírus, a válvula fará com que o vírus se espalhe pelo ar e contamine outras pessoas. “Quando você usa máscara com válvula, ela só está protegendo você mesmo. Então você acaba, sem saber, tendo uma atitude egoísta, porque está expondo outras pessoas. Esse tipo de máscara não deve ser utilizado nas ruas, somente em ambiente hospitalar”, pontua.

“Muitas pessoas optam por esse tipo para respirarem melhor porque com as outras máscaras, dependendo do material, vai ser mais difícil respirar e até eliminar o gás carbônico. Então, a pessoa acaba inalando um pouco mais desse gás, e muitas vezes, dependendo da situação, se ela estiver andando mais rápido, por exemplo, vai sentir cansaço”. Ainda assim, o especialista orienta que as pessoas priorizem o uso das máscaras caseiras e de tecido.

Evite sair em grupos

O distanciamento social, ou seja, a distância que as pessoas devem manter umas das outras, também é fundamental para diminuir o contato respiratório entre elas. Apesar disso, em vias públicas onde há pontos de ônibus, bancos e outros estabelecimentos em que pode haver filas, é possível observar diversas pessoas que, na maioria das vezes, estão muito próximas umas às outras. Além da proximidade, há também aquelas que vão para estes locais acompanhadas de amigos ou familiares.

“Há pessoas que vão com crianças para as filas, e, muitas vezes, a criança está sem a máscara. O risco da doença para a criança é menor do que ela pode oferecer para outras pessoas, por exemplo (caso a criança seja assintomática). Então é preciso evitar sair às ruas em grupos. Se não tiver alternativa, o ideal é o uso de máscara. A preocupação social precisa existir”, analisa Rodrigo.

Em relação a filas, a recomendação é de distanciamento de, pelo menos, um metro e meio. “Alguns estabelecimentos já preveem as filas e fazem a marcação no chão. Isso é o ideal. Só que as pessoas não estão respeitando essa sinalização. É mais importante manter o distanciamento social do que o comércio fechado, por exemplo. As pessoas vão ter que mudar seus hábitos”, alerta.

‘Não há nenhum lugar que esteja protegido ou isento do risco’

À medida em que as pessoas se distanciam do centro urbano, parece acontecer um “relaxamento” das medidas preconizadas pelas autoridades de saúde para a redução da contaminação pelo coronavírus. Pelo menos foi o que constatou a Tribuna no dia em que a equipe visitou o Bairro Benfica, Zona Norte. No local, principalmente na Praça de Benfica e na rua principal do bairro, há muitas pessoas circulando. Muitas sem máscaras e em grupos.

Grávida de 7 meses, a arrematadeira Juliana Santos Silva, 26 anos, tomava sol na praça quando confirmou à reportagem que a circulação de pessoas tem sido intensa e frequente no local. Segundo ela, muitas pessoas não estão utilizando máscaras e tomando cuidado. Na avaliação dela, parte dos moradores não estaria ciente da gravidade da situação, acreditando que o vírus “não chega em Benfica”. “Eu tomo cuidado, uso máscara, porque estou grávida e preciso me cuidar. Saio só aqui na praça para tomar sol, mesmo assim não é com frequência. Mas muitos não estão nem aí”, conta.

Em um bar no mesmo bairro, apesar do anúncio na entrada proibir a entrada de pessoas sem uso de máscaras, um morador do local tomava sua cerveja e fumava seu cigarro imperturbado. “Aqui não tem perigo”, respondeu à reportagem a respeito do risco de contaminação pelo vírus. “Eu acho que temos que usar máscara sim, e tomar cuidado, mas mais em ambientes fechados. Aqui é local aberto, estou mantendo a distância, acho que não tem perigo”, completa.

O infectologista Rodrigo Daniel alerta, entretanto, que devemos manter a preocupação com a doença em qualquer local. “Nos bairros mais afastados da região central há uma menor preocupação com o uso de máscara e com o distanciamento social, até porque tem menos fiscalização, menos gente cobrando e orientando. Mas temos que entender que qualquer pessoa que se desloque entre estes locais pode estar infectado e transmitir, ainda mais se ela for assintomática”, explica.

O médico pontua ainda que a Covid-19 é uma doença que se espalha de forma muito rápida, e em pouco tempo se perde o controle de quem está ou não contaminado. Portanto, é preciso ter precaução em todos locais, inclusive em áreas afastadas da região urbana. “Aqui em Juiz de Fora vão ter locais com mais e outros com menos casos da doença, mas não tem nenhum lugar que está protegido e isento do risco. Pode ser que a gente comece, por exemplo, a verificar que passe o pico da doença nas regiões mais urbanas, e comece um maior número de casos na zona rural e bairros mais periféricos. Com isso começa o que a gente chama de segunda onda: quando parece que os casos começam a diminuir, mas na verdade começam a crescer em novos locais.”

É possível diminuir o risco?

– Em filas e dentro dos ônibus

Foto: Fernando Priamo

Além das filas em estabelecimentos, também é habitual a aglomeração de indivíduos em pontos de ônibus, principalmente na porta do coletivo urbano, quando as pessoas vão adentrar o veículo. Mesmo agora, durante a pandemia, a circunstância é frequente, principalmente nas ruas centrais da cidade, como nas avenidas Barão do Rio Branco e Getúlio Vargas. “Não há muito o que fazer”, conforma-se o autônomo Hélio Ricardo Pury, 53 anos, enquanto espera o ônibus que o levará até o bairro onde mora. “As pessoas estão usando máscaras, mas dentro do ônibus todo mundo fica próximo, e os pontos ficam cheios”, conta. Hélio tem pegado dois ônibus por dia, pelo menos três vezes na semana.

Sobre o que é possível fazer para mitigar os riscos de contaminação pelo coronavírus, o infectologista Rodrigo Daniel opina que é preciso ter organização. “Claramente a gente precisaria ter os pontos mais organizados, ter distribuição das filas de acordo com o número de ônibus. E isso é possível de ser feito, em cidades maiores há esse tipo de organização, não há esse funil de pessoas que é visto na porta de ônibus igual em Juiz de Fora. É preciso que o ente público e a população organizem isso”.

Como outra medida, o médico também recomenda que as pessoas não fiquem muito tempo esperando a condução. O ideal, na avaliação dele, é que a pessoa somente vá para o ponto em horário próximo ao que o ônibus passará. Dentro do veículo, a orientação é para uso constante de máscara. “Se possível, a pessoa deve evitar tocar superfícies e depois levar a mão à região do rosto. Deve evitar conversar, puxar a máscara, e também evitar comer e beber dentro dos ônibus.”

– Na hora do lanche

Foto: Fernando Priamo

Para quem passa o dia todo fora de casa é muito difícil deixar de fazer alguma refeição do dia em locais como padarias, lanchonetes e restaurantes. Nessas horas, é preciso cuidado e higiene, recomenda o infectologista Rodrigo Daniel. De acordo com ele, o ideal é que a pessoa tenha mais que uma máscara disponível para que, após o lanche, ela coloque a proteção limpa. “Antes de retirar a máscara a pessoa deve higienizar as mãos (com água e sabão ou álcool em gel) e não retirá-la pela frente, somente pelos elásticos. O ideal é colocá-la em um saquinho, e não deixar que a máscara toque nenhuma superfície ou outra parte do corpo”, indica o médico.

Portanto, não é adequado a pessoa puxar a máscara para a região do queixo e pescoço enquanto se alimenta, ou deixá-la pendurada pelo elástico em uma das orelhas. Nesse momento, a parte de dentro da proteção entra em contato com regiões que podem estar contaminadas. Da mesma forma, segundo o médico, é pouco higiênico deixar que esse equipamento de proteção encoste em locais como mesas, cadeiras e balcões, principalmente em locais públicos.

– Na feira

Foto: Fernando Priamo

“Eu faço uso de máscara todo o tempo, utilizo álcool em gel e ofereço aos fregueses. Mas gostaria de saber se tem alguma outra medida que pode ser adotada para reduzir ainda mais o risco de contaminação”, questiona o feirante Martinho Xavier de Barros Filho, 45 anos, responsável por uma barraca de doces e ovos na Feira Semanal da Agricultura Familiar, que agora acontece na Rua Barão de São João Nepomuceno, no Centro, às terças e quintas.

Na opinião do médico Rodrigo Daniel, apesar de as feiras acontecerem em vias públicas, nesse momento seria adequado haver controle de fluxo de entrada e saída também nas feiras livres. “Sou favorável que elas funcionem, mas precisa ter um ordenamento, como adotar o controle do fluxo de entrada e saída desse local, a fim de garantir maior segurança para todo mundo. Acho que há condições disso ser feito”. Para o médico, outra providência que poderia ser tomada é a reserva de horários específicos para determinados públicos circularem nestes locais, como alguns mercados já adotaram. “Por exemplo, reservar os primeiros horários (de funcionamento da feira) para pessoas acima de 60 anos evitaria que eles ficassem em grandes aglomerações.”

Os feirantes Roberto Matias, 53, e Bruno Oliveira, 33, responsáveis por uma barraca de queijo e laticínios na mesma feira, contam que, após a pandemia, passaram a adotar a máquina de cartões para diminuir o contato com cédulas de dinheiro. “Apesar de a maioria das pessoas ainda optar por pagar em dinheiro, percebemos que a demanda pelo pagamento com o cartão aumentou”, conta Bruno.

Nesses casos, o infectologista explica que, apesar da possibilidade de alimentos, dinheiro e cartões estarem contaminados, não são grande fonte de contaminação do coronavírus. “É bom lembrar que o vírus não é adquirido pelo contato com as coisas. Ele não entra pela mão, por exemplo. Então, mesmo que a pessoa tiver contato com dinheiro ou fonte contaminada, se houver a assepsia das mãos com água e sabão ou álcool em gel 70º, após esse contato, a chance de contaminação vai ser muito reduzida”. Aos que frequentam as feiras livres, a recomendação é a mesma para aos que vão às ruas e a outros estabelecimentos: uso correto de máscaras, distanciamento social e assepsia das mãos após contato com superfícies.

Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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