Idoso é preso por chamar professora de ‘macaca’

Professora viajava para Juiz de Fora para participar de palestras em escolas sobre violência doméstica e pedofilia (Foto: Arquivo Pessoal)

Um homem de 81 anos foi preso em flagrante pelo crime de injúria racial após supostamente chamar uma professora, 41, de “macaca” ao embarcar no mesmo ônibus em Santos Dumont, da linha Barbacena/Juiz de Fora. O caso aconteceu na manhã de segunda-feira (2) e resultou na prisão do suspeito, porque a vítima não deixou que ele escapasse. “Ele entrou, olhou para mim e disse: A macaca já está sentada. Eu perguntei: Você está me chamando de macaca? Quando eu disse que ele não poderia falar isso, porque era falta de respeito e até crime, ainda quis me intimidar dizendo que era policial aposentado e que não tinha medo de polícia, mas não é”, contou Delydia Cristina Cosme Silva.

Segundo ela, a ofensa foi totalmente gratuita e não teria relação com assentos, já que havia um lugar vago logo do outro lado do corredor.

“Eu continuei dizendo que não era pessoa leiga, que tenho duas formações superiores e que a lei foi feita para ser cumprida, por isso estava acionando a PM. Quando viu que eu estava mesmo ligando para a polícia, ele desceu do ônibus, e eu desembarquei atrás, porque senão iria descaracterizar o flagrante.”

Mesmo trêmula, a vítima não pensou duas vezes e continuou em contato com a PM para dar sua localização. Nesse ínterim, o idoso entrou em uma lotérica e depois tentou embarcar em um coletivo urbano, mas teria sido impedido por alunos que a professora do ensino fundamental encontrou naquela área do Bairro São Sebastião, ainda em Santos Dumont.

Posteriormente, entretanto, o suspeito conseguiu entrar em outro ônibus intermunicipal que seguia para Juiz de Fora. A vítima que é também coordenadora pedagógica foi atrás. “Ele passou na roleta, e eu fiquei paralisada ali. Enquanto isso, a PM disse (ao telefone) que havia chegado ao local, mas que eu não estava.” Nesse momento, a vítima contou com ajuda dos funcionários da empresa e dos passageiros, que se solidarizaram com a causa e também se indignaram. O coletivo interrompeu a viagem na altura de Ewbank da Câmara, e o idoso acabou preso em flagrante com a chegada dos policiais.

“Quando o motorista explicou que havia solicitação da PM por crime de injúria racial e que ninguém poderia descer até a polícia chegar, todo mundo se manifestou para agir como testemunha. Ele ficou na porta, querendo sair, mas não deixaram. Ainda perguntou: Por que o ônibus está parado? Só por causa de uma bobeira dessa? Eu assumo que a chamei de macaca.” Segundo a vítima, a afirmação dele causou mais revolta. “Só respeitaram e não fizeram nada porque ele é idoso.”

Já diante da PM o suspeito negou qualquer crime. Ele afirmou ter o costume de brincar com as pessoas e disse não ter chamado Delydia de macaca. O homem recebeu voz de prisão e foi levado para a delegacia de Santos Dumont. De acordo com a delegada responsável, Kênia Oliveira, ele foi autuado em flagrante delito pelo crime de injúria racial e encaminhado ao presídio na mesma cidade. “Ele negou os fatos. Disse que não dirigiu a palavra à vítima. E sim que brincou com o cobrador o chamando de careca.” Ainda conforme a delegada, o homem já respondeu a inquérito também por injúria racial no ano de 2017 em Barbacena.

Referências
Por coincidência, Delydia viajava para Juiz de Fora para participar de palestras em escolas sobre violência doméstica e pedofilia. Ela já pretendia tratar da questão racial em sua fala. Estava inspirada nas declarações da atriz Cacau Protásio, que desabafou no último domingo no programa Fantástico da TV Globo sobre os insultos que recebeu depois de gravar cenas do filme “Juntos e Enrolados”, em um quartel do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. O áudio estava circulando nas redes sociais e foi atribuído a um bombeiro. Além de racismo, o conteúdo tinha ataques gordofóbicos e homofóbicos.

Mesmo tendo sofrido quando criança na escola, Delydia sempre buscou inspiração em sua própria família, de mãe professora e pai funcionário de multinacional, e também em ícones nacionais e internacionais, como Glória Maria, Grande Otelo, Nelson Mandela, Martin Luther King, além de sambistas famosos, como Jamelão. “Admiro muito a Luislinda de Valois Santos, primeira desembargadora negra do Brasil.”

Quando olha para trás, a professora tenta mudar o presente e o futuro. “Sofri muito quando estava na primeira série. Disseram que eu era preta que nem asfalto e que se fossem assim também já teriam pulado da janela. Foi horrível, mas fez toda diferença. Minha mãe me levou em reuniões de grupos de negros e me ensinou valores. Não dá para ignorar ser chamada de macaca e não lembrar do Apartheid, deixar passar por isso mesmo. Pelos meus alunos e pelo direito à diversidade. Não dá para falar que o Brasil não foi escravizado, ignorar a história e nossa cultura. Minha família vem de um quilombo remanescente. Eu falo sempre para as pessoas e principalmente a meus alunos que nós que somos negros somos lindos. O negro é lindo!”

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Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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