Há 98 anos era inaugurada a Estação Ferroviária Pedra Mole

Wôlmer Ezequiel/Arquivo DAEstação Pedra Mole foi restaurada e devolvida à comunidade depois de passar décadas em ruínas A primeira estação ferroviária de Ipatinga completou 98 anos de inauguração. No dia 1º de agosto de 1922 foi aberta a estação, então nomeada pelo construtor da Estrada de Ferro Vitória a Minas, Pedro Nolasco, como Estação Ipatinga. Pedra Mole é o nome dado pelos índios Botocudos à localidade onde hoje está instalado o bairro Cariru, por ser uma área de terreno arenoso onde os trilhos da estrada de ferro afundavam quando da passagem das pesadas locomotivas. Em consequência disso, a estação ficou conhecida posteriormente pelo “apelido” de Estação Ferroviária de Pedra Mole. Conforme registro do livro Cidade Jardim, de José Augusto de Moraes, essa foi a primeira estação à margem do rio Piracicaba, na foz do Rio Doce, situada no Km 475,000. Na época a área era território do município de Coronel Fabriciano. Uma das versões apontam que seu nome, dado por Pedro Nolasco, seria a junção dos nomes dos municípios vizinhos: “Ipa” de Ipanema e “Tinga” de Caratinga. A versão da composição do nome Ipatinga foi contestada pelo folclorista e historiador mineiro, professor Saul Martins que afirmou que “Ipatinga” é uma legítima formação Tupi e significa “Pouso de Água Limpa”. Sem registro oficial José Augusto observa que, na história da Estrada de Ferro Vitória a Minas a Estação Ipatinga e a única que não possui fotos e nenhum relato oficial sobre sua existência. Talvez tenha sido pelo erro estratégico em construir uma estação em um local totalmente inadequado para passagem dos trilhos, como foi provado logo em seguida. A Vale contou a história até a Estação de Inhapim (Ipaba), inaugurada no mesmo dia de Pedra Mole. Porém, saltou a estação de Ipatinga e passou a contar a história a partir da Estação do Calado (Coronel Fabriciano). Saltou inclusive a Estação de Nossa Senhora, uma estaçãozinha de madeira, inaugurada também em 1922 no atual bairro Horto, onde também funcionou uma farmácia mantida pela empresa cujo farmacêutico foi Raimundo Alves Carvalho (posteriormente, prefeito de Coronel Fabriciano), que veio de São Pedro dos Ferros no dia 27 de setembro de 1922. A Estação de Nossa Senhora, na ocasião, era o ponto final do trem. Quintal “Quando viemos morar no bairro Cariru, em 1963, o Sítio de Pedra Mole era nosso fundo de quintal. O Rio Piracicaba era nosso mar. Nas nossas incursões pelo então desconhecido Sítio de Pedra Mole, encontramos: pontas de flechas, garruchas enferrujadas, pedaços de arreios, colheres enferrujadas, o que restou de uma casa e várias outras peças que garantiram que por ali passaram os índios e outras pessoas”, conta José Augusto de Moraes.Alex Ferreira/Arquivo DARuínas da antiga Estação Ipatinga, inaugurada em agosto de 1922 Febre Mortal Na construção da Estrada de Ferro Vitória a Minas, foi aproveitada a mão de obra provinda da Estrada de Ferro Leopoldina e da Central do Brasil. Vários trabalhadores chegaram, e a febre impiedosa atacava. Essa febre era a malária, também chamada de sezão ou maleita.Os registros indicam que num só dia morreram trinta operários no trecho, e mesmo aumentando a dose de quinino, a febre continuava. Foi assim que os construtores liderados pelo engenheiro chefe do trecho, Benedito Otoni, solicitaram da empresa Vitória a Minas o embarque para Pedra Mole de trezentos operários da Bahia. Dias depois quase todos morreram, sobrevivendo somente o baiano Lino Paulo do Nascimento (em pé na foto), nas proximidades, sendo enterrados em cova rasa, quase que sobrepostos. Barro e o perigoso “Calado” Quem conheceu também a “Estação de Pedra Mole” foi Joaquim Felício Sobrinho, mais conhecido por Joaquim Peixeiro. Joaquim Peixeiro veio para Ipatinga em 1918, justamente para trabalhar no desmatamento da área onde iria passar a estrada de ferro. Mais tarde, foi um dos empreiteiros contratados pela empresa Vale do Rio Doce, para o desmatamento da área onde está instalada a Usiminas e para a mudança da estrada de ferro da Estação de Pedra Mole para o centro da então Vila Ipatinga.Segundo ele, “o espaço onde está hoje o bairro Cariru era um local barrento. Com o peso das locomotivas que, naquela época, eram chamadas de ‘Maria Fumaça’, os trilhos cediam, exigindo constantes substituições. A mudança foi benéfica, portanto, para Ipatinga, principalmente porque a estação foi construída bem no coração do povoado.Joaquim Peixeiro também contava que os companheiros de serviço eram chamados de “camaradas” e que o maior perigo na região não eram as feras, mas as idas ao “Calado” (Coronel Fabriciano). “Os camaradas iam lá, a fim de fazer as ‘compras para as cozinhas’ e acabavam se excedendo na bebida. Sempre ficava um estendido em poça de sangue”. O fim da estação A Estação de Pedra Mole funcionou por mais ou menos oito anos. Os motivos de sua desativação, entre as hipóteses estão: o grande susto causado pelas mortes dos duzentos e noventa e nove baianos, no fim da construção da estação e dos trilhos da região; a proximidade com a Lagoa das Antas ou Lagoa do Roque, onde o mosquito responsável pelas doenças se proliferava com muita intensidade; a exiguidade de espaços para uma expansão, e a existência no local de um tipo de solo de fácil erosão.No fim da década de 1920, a solução foi evitar aquele trecho onde as pontes pareciam ineficazes, mudando-se bastante o trajeto da ferrovia. Foi construído o pontilhão de ferro, sobre o ribeirão Ipanema, que hoje liga o bairro Veneza ao Centro da cidade, utilizado por pedestres.A estação se foi, mas Pedra Mole ainda permaneceu como cemitério na cidade até 1942, quando o padre Diolindo instala um cruzeiro e inaugura o novo cemitério do pequeno povoado, ao lado da nova estação. No cemitério de Pedra Mole os corpos eram enterrados enrolados em panos. Nesse período, não eram utilizados os caixões.Na década de 1960, nas proximidades de Pedra Mole foi construído um estábulo (cocheira) onde ficavam alojados os cavalos dos diretores da Usiminas, principalmente dos japoneses. Eram cavalos das raças Campolina e Manga Larga.Wôlmer Ezequiel/Arquivo DAA Estação Pedra Mole foi recuperada e entregue à população em dezembro de 2019; depois fechada como medida preventiva na pandemia Abandonado por décadas, local histórico foi restaurado e devolvido à comunidade Por décadas, as ruínas da Estação de Pedra Mole, teimosamente, permaneceram ali, no fim do atual bairro Cariru aos pés do bairro Castelo. Insistiam em mostrar que por ali passou o primeiro trem que trouxe pessoas para povoar o que seria a então Vila Ipatinga. Conseguiram a primeira vitória quando foram tombadas pelo Patrimônio Histórico e Cultural da Cidade. Porém, apesar do tombamento, por muito tempo ficaram abandonadas à própria sorte. No terreno de Pedra Mole sobreviveram o grande paredão lateral da estação, a plataforma de embarque e desembarque e a escadinha de acesso. A segunda vitória das ruínas de Pedra Mole veio no ano de 2018, quando foram iniciados os projetos para a restauração. A terceira e definitiva vitória ocorreu em dezembro de 2019: O sítio de Pedra Mole transforma-se em um canteiro de obras. No dia 10 de dezembro de 2019, às 17h, a Estação de Pedra Mole é entregue à comunidade totalmente restaurada. Um local de uma paisagem exuberante que se completa com uma obra executada pela Usiminas, conforme noticiado pelo Diário do Aço.A reforma veio de um acordo entre o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), por meio da 9ª Promotoria de Justiça de Ipatinga, e a Usiminas, que firmaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e isso resultou na restauração das ruínas da Estação de Pedra Mole, na realização de benfeitorias no local e na abertura do bem tombado à visitação Pública. Atualmente o acesso à estação encontra-se fechado por causa das medidas sanitárias de contenção da pandemia de covid-19. “Felizmente, a Estação Ferroviária de Pedra Mole vai poder contar sua história para a população de Ipatinga e para todos que se interessarem por ela. Assim esperamos que seja”, conclui José Augusto.

Postado originalmente por: Diário do Aço

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