O consumo de água em Juiz de Fora está elevado. De acordo com levantamento da Cesama, entre janeiro e setembro deste ano, cada habitante utilizou, em média, 161,8 litros de água diariamente. Para se ter ideia, o valor é 47% superior ao preconizado como essencial pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que são 110 litros, e acima do registrado em anos anteriores. Em 2018, por exemplo, a população consumiu, em média diária, 156,8 litros de água, 3% a menos que o registrado atualmente. Na verdade, de acordo com a companhia de abastecimento, os juiz-foranos voltaram ao hábito de consumo no mesmo patamar de 2013, ano que antecedeu a crise hídrica que causou desabastecimento no Sudeste do país em 2014 e 2015.
De acordo com o diretor de Desenvolvimento e Expansão da Cesama, Marcelo Mello do Amaral, a cidade contribuiu com a redução significativa do consumo de água durante a crise hídrica, entretanto, a normalização dos períodos de chuvas e o armazenamento seguro de água nas represas que abastecem o município criaram um cenário que resultou no aumento do consumo. “Houve o momento da queda por conta da escassez. Com isso, as pessoas tomaram consciência e atenderam ao apelo de uso racional. Mas há um natural aumento na medida em que a situação cai dentro da normalidade: nos anos seguintes começamos a ter chuva regulares e, além disso, o sistema começou a suportar variações climáticas como as em que estamos enfrentando agora”, explicou.
De fato, dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) comprovam isso. No ano de 2013, o acumulado de precipitações em Juiz de Fora superou a média histórica do período em 11,4%, enquanto que, em 2014 e 2015, os valores ficaram aquém do esperado, respectivamente, em 39,8% e 23,3%, quando o município precisou enfrentar rodízio no abastecimento. Já em 2016 as chuvas novamente superaram a média histórica em 3,3%, enquanto que em 2017 faltaram 42,7% da média histórica para atingir o patamar. A diferença é que, naquele ano, Juiz de Fora já contava com as águas oriundas da Represa de Chapéu D’Uvas, que é 11 vezes maior que o manancial João Penido, até então o maior do município em capacidade de acumulação. Ano passado, com o consumo inferior ao registrado este ano, choveu 5,7% além do esperado pela média, mas este ano, até o momento, o acumulado está em 51,2% do previsto e possivelmente a média histórica não será atingida.
Uso consciente
Os 110 litros de água por dia, preconizados pela OMS, seriam suficientes para necessidades básicas, como saciar a sede, cuidar apropriadamente da higiene e preparar os alimentos. “Dentro dessa lógica, o juiz-forano consome acima disso. Por outro lado, ao compararmos com capitais como Rio, São Paulo e Belo Horizonte, – onde os consumos são tipicamente superiores -, Juiz de Fora tem um consumo mais consciente e racional, fruto, talvez, até dos momentos em que passamos por crise”, avalia Marcelo
Gasto chega a ser 20% mais alto em períodos quentes
Embora os mananciais de Juiz de Fora estejam em níveis satisfatórios de acumulação de água, a Cesama explica que o sistema exige atenção redobrada em condições específicas. Um exemplo é o ocorrido em setembro, quando a cidade enfrentou dias consecutivos sem chuvas, baixa umidade relativa do ar e temperaturas elevadas, superiores a 30 graus. “O aumento do consumo de água em períodos quentes é previsto pela literatura dos sistemas de distribuição do recurso. Ao longo do ano é estimado que exista um dia que é considerado o de maior consumo, tipicamente o mais quente e o mais seco. Por isso, é preciso que se considere uma variação de até 20% de consumo em relação à condição mais baixa. Em Juiz de Fora, a gente experimenta essa variação que, em alguns momentos, chega a ser superior aos 20%”, afirma Marcelo Amaral.
O diretor ressalta, por outro lado, que o sistema de distribuição da Cesama normalmente passa por muitas manutenções diárias e que, somado a fatores sazonais, pode gerar impacto na rede de distribuição. “Temos um sistema muito complexo de distribuição por conta da topografia da cidade. Contamos com mais de 170 casas de bombas elevatórias e 90 reservatórios – e normalmente são necessárias paradas de manutenção. Então, quando estamos em momentos de muito calor e consequente aumento de consumo, essas paradas são necessárias e existe uma dificuldade para retorno. Por isso a questão do uso consciente tem impacto inclusive nesses momentos de manutenção.”
Necessidade de economizar
Embora, segundo a Cesama, as condições atuais de abastecimento no município estejam sob controle, há cerca de um mês, durante a onda de calor, moradores de diferentes regiões reclamaram da falta d’água. Em entrevista à Tribuna, o diretor técnico-operacional da Cesama, Márcio Augusto Pessoa Azevedo, afirmou que a situação era preocupante e que tinha ligação com a situação atípica do tempo.
Relacionada à memória recente do desabastecimento, os registros pontuais de falta d’água, observados mês passado, durante a onda de calor, geraram apreensão na população e foi, inclusive, um dos tópicos debatidos em audiência pública na Câmara Municipal, no último dia 17. No encontro, a Cesama foi questionada sobre a situação dos reservatórios e da distribuição de água nos próximos meses e destacou que, para o próximo ano, a companhia espera ter um aumento significativo, não só da captação, mas da produção de água por meio de obras estruturantes.
Pretende, ainda, intensificar campanhas de conscientização e estruturar um programa de perda técnica, que é formada pela água tratada que não chega aos lares, em razão de vazamentos. Na cidade, o percentual de perda é estimado em 30%. Para isso, a companhia planeja, com recursos da Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário de Minas Gerais (Arsae), investir na identificação de falhas e substituição de redes.
Alternativas racionalizam uso e podem gerar economia no bolso
Economizar água e utilizá-la com consciência é fator importante, uma vez que o recurso é finito. Seu uso exagerado, portanto, além de impactos negativos para o meio ambiente e para a sociedade, também reflete no bolso do consumidor, já que o fornecimento de água tratada é um serviço pago. Mas é possível reduzir o consumo sem transtornos, através de medidas simples e práticas (ver quadro). “Independentemente da situação em que estão os mananciais, pedimos uso consciente da população em relação ao recurso hídrico porque, além de ser finito, sua disponibilidade está sujeita a condições climáticas”, pontua o diretor de Desenvolvimento e Expansão, Marcelo Mello do Amaral.
Pensando em sustentabilidade e com consciência para “poupar muita água” a professora de Arquitetura e Urbanismo Letícia Zambrano criou, em casa, junto ao marido, que é professor de engenharia, um sistema para captação e armazenamento de água da chuva para utilização no dia a dia. Refletir sobre práticas sustentáveis é uma constante para a professora, que ministra a disciplina de Integração dos Princípios de Sustentabilidade à Arquitetura e Urbanismo.
“A água é muito barata, então as pessoas não dão valor. Mas a verdade é que ela é um recurso natural, escasso e finito. Então, aqui em casa economizamos e reaproveitamos muito. Por exemplo, lavamos vegetais e, se não tem sabão, reutilizamos a água para regar outras plantas. É tudo uma questão de consciência”, relatou.
Para armazenar a água da chuva, o casal criou dois sistemas: o primeiro com três tonéis com capacidade para 200 litros em cada e outro formado por dois recipientes cuja capacidade total de armazenamento chega a 5 mil litros de água. “Com esse reservatório, regamos o jardim, a horta, árvores frutíferas. Toda água que é usada na parte externa da casa vem dessa captação da chuva”. Conforme a professora, com os reservatórios totalmente cheios foi possível utilizar a água por cerca de 60 dias e resultou na redução aproximada de 25% de água consumida diariamente em sua casa.
Simples mudanças
Buscando soluções para a economia de água e para diminuir o valor da conta ao fim do mês, o síndico de um condomínio no Bairro Democrata, Cláudio da Silveira, propôs aos moradores uma alternativa para economizar água durante a descarga sanitária. “Como os vasos sanitários dos apartamentos têm as caixas acopladas, nós estimulamos os moradores a colocarem garrafas pet de dois litros, cheias de água, dentro da caixa. Isso aí reduz em dois litros a quantidade de água dada na descarga. Levando em consideração que, em média, cada residência dê 20 descargas por dia, teremos uma redução de 40 litros de água por dia em cada apartamento”, projeta o síndico, responsável por um condomínio com 564 apartamentos. A expectativa é que, somente com essa atitude, haja uma redução de R$ 3 mil na conta de água do condomínio, cerca de 10% do valor atual, segundo o síndico.
Também pensando em uma alternativa econômica para lavar o terraço do se apartamento que a jornalista Carla Gonçalves da Silva passou a armazenar a água da chuva para o serviço doméstico. De forma amadora e prática, ela passou a armazenar o recurso em baldes que tem em casa. “A água da chuva, apesar de não ser sempre disponível, é sem custo e funciona muito bem. Também uso para a regar plantas, principalmente em períodos mais quentes, em que elas precisam de água todos os dias. Essa ação me levou, inclusive, a pensar em alternativas mais sustentáveis para outras áreas da casa, como usar cortinas claras pra aproveitar ao máximo a luz do sol e reduzir o consumo de energia com lâmpadas acessas”, contou.
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Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora